sexta-feira, 25 de novembro de 2011


Foram selecionados os pacientes atendidos no Ambulatório de Adolescentes e Drogas do Grupo

Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas (GREA) e do Setor de Psiquiatria da Infância e Adolescência (SEPIA), ambos do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, que obedeciam aos seguintes critérios de inclusão: (1) idade entre 11 e 17 anos; (2) diagnóstico de abuso ou dependência de substâncias psicoativas, segundo o DSM-III-R; (3) morar na Grande São Paulo.

Foram excluídos os pacientes que apresentavam: (1) diagnóstico de retardo mental, segundo o DSM-III-R; (2) diagnóstico de síndrome esquizofreniforme, esquizofrenia ou outros sintomas psicóticos que dificultassem a abordagem psicoterápica dos pacientes, segundo o DSM-III-R; (3) qualquer contra-indicação de tratamento ambulatorial, por patologia clínica, impossibilidade de continência familiar, uso excessivo de drogas que impedisse a desintoxicação em regime ambulatorial ou estado psiquiátrico naquele momento que necessitasse de internação; (4) ausência de familiares que se dispunham a comparecer no serviço de atendimento; e, (5) menores institucionalizados. O tratamento oferecido era exclusivamente ambulatorial e contava com psicoterapia individual semanal no primeiro mês de seguimento; psicoterapia de grupo semanal,

a partir do segundo mês de tratamento; terapia familiar quinzenal e avaliações psiquiátricas mensais. O paciente era submetido a uma entrevista semi-estruturada para a coleta padronizada de dados sociodemográficos, rendimento escolar, histórico e padrão de uso das drogas consumidas, assim como o envolvimento em atividades ilegais. Os pacientes foram acompanhados por 12 meses, sendo avaliados pela escala de Seguimento de Adolescentes Usuários de Drogas (ESA-Adolescentes).

RESULTADOS

A amostra totalizou 53 pacientes, com média de idade de 15 anos e com 2,3 anos de uso de drogas; 91% eram do sexo masculino e 49% eram filhos de pais separados. O início do consumo de drogas foi precoce, iniciando-se em média aos 11 anos com o consumo de álcool. O padrão de progressão do consumo de drogas foi: drogas lícitas (álcool ou tabaco), maconha, cocaína inalada e "crack". Apesar da alta prevalência do consumo de inalantes entre estudantes brasileiros, a demanda por tratamento para essa substância foi baixa neste serviço. O consumo de inalantes ocorreu após o uso de drogas lícitas e maconha, mas em diferentes estágios da progressão de consumo. Todos os pacientes usavam uma média de 4,7 tipos diferentes de drogas. A maioria (64%) já tinha realizado roubos ou furtos, por volta dos 13,6 anos, após o uso regular de maconha, mas antes do uso de cocaína inalada. Aos 14,4 anos, após a experimentação de cocaína e o aparecimento de problemas pelo consumo de inalantes, maconha e álcool, 85% interromperam os estudos.

Mais tardiamente, aos 14,5 anos, deu-se o envolvimento com tráfico de drogas em 47% dos casos, quando se iniciava o uso regular de cocaína inalada e "crack". O principal fator alegado para a manutenção do consumo de álcool, tabaco, maconha, cocaína inalada e "crack" foi a necessidade de sentir os "efeitos das drogas", especialmente para aliviar sintomas depressivos. A pressão exercida pelo grupo de amigos foi importante para o início do consumo principalmente de álcool e maconha, enquanto para o "crack" essa influência não foi verificada.

A aderência a esse programa de tratamento foi semelhante àquela verificada em outros programas de tratamentos de adultos dependentes químicos: 64,1% dos pacientes continuavam em tratamento após 12 meses, não havendo diferenças estatisticamente significativas entre os que abandonaram e aqueles que completaram o tratamento. A participação da família e o não-envolvimento do paciente em atividades ilegais pareceram contribuir, clinicamente, para a melhor aderência ao tratamento. Entre os fatores preditivos de evolução, foram verificadas diferenças significativas: quanto mais precoce o início do consumo de drogas em geral e/ou maior o consumo de "crack", pior a evolução no tratamento.

CONCLUSÕES

Apesar do pouco tempo de consumo de drogas, comparados com farmacodependentes adultos, esses adolescentes apresentavam quadro clínico grave no início do tratamento, evidenciado pelo alto índice de abandono de escola e envolvimento em atividades ilegais. O padrão de progressão do consumo de drogas foi semelhante àqueles descritos na literatura internacional, iniciando-se com o uso de substâncias lícitas, passando para o uso da maconha e posteriormente para outras drogas ilícitas. O destaque fica para os inalantes, classe de substâncias não descrita nos estudos internacionais da evolução de consumo: seu uso ocorreu após o uso de drogas lícitas e maconha, mas em diferentes estágios do padrão de progressão. A participação da família no tratamento de adolescentes usuários de drogas é fundamental e especialmente importante na manutenção do paciente no seguimento. O início precoce de qualquer substância e o uso de "crack" em particular estão relacionados com pior prognóstico em tratamento ambulatorial, para pacientes nessa faixa etária.

O entendimento das várias "pressões" e tendências do uso de álcool e drogas entre os jovens pode ser útil nos esforços para prevenir a evolução do uso experimental ou recreacional, para a situação de dependência, cujas conseqüências são maiores, prevenindo o prognóstico pior. Os resultados encontrados apontam aspectos a serem estudados por trabalhos quantitativos futuros, com maior amostragem. Os sintomas depressivos referidos por alguns pacientes apontam para a importância do diagnóstico diferencial entre quadros depressivos e dependências de drogas, principalmente os estimulantes, no tratamento de adolescentes usuários de drogas e/ou álcool.


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